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Por uma cultura a favor da Cidade Humana

Impossível avançar sem antes pactuar com o leitor algumas definições. Trago para esse artigo o conceito de Cidade Humana derivado do trabalho de pesquisa do Instituto Paulista de Cidades Criativas e Identidades Culturais (IPCCIC), resultado de cinco anos de atividade de campo, com visitas a cidades de todo o Brasil.

O grupo foge ao reducionismo, por isso, apregoa que uma Cidade Humana é aquela que (1) coloca o ser humano em primeiro lugar; (2) forma cidadãos cocriadores; (3) fortalece o sentido de comunidade; (4) religa o ser humano ao meio ambiente; (5) fomenta a economia cocriadora e (6) educa em suas múltiplas formas. Desses seis passos, os pesquisadores ramificam para modelos e arriscam, nessa fase do trabalho, a apresentar trilhas de saberes para a obtenção dos resultados propostos[1].

Para definir cultura, conceito polissêmico que desfila por muitos campos, trago como referência o trabalho do chileno Humberto Maturana, para quem “uma cultura é uma rede fechada de conversações.”[2] E, a partir dessa assertiva, acrescento, “conduta cultural é a configuração comportamental que, adquirida ontogeneticamente na dinâmica comunicativa de um meio social, é estável através de gerações.”[3]

Com isso, assevero que, para avançarmos rumo à Cidade Humana, teremos que propiciar o surgimento de uma cultura que a reivindique coletivamente. E tal tarefa não será possível, sem que criemos novas redes de conversações vinculadas a cada um dos passos descritos acima.

Para colocar o ser humano em primeiro lugar é fundamental desconstruir redes de conversações que estabelecem padrões culturais, como por exemplo, “o homem pode mais do que a mulher”; ou, “raça superior e raça inferior”; ou ainda, uma rede bem conhecida, “o mundo é dos espertos”.

Nessa mesma linha, para formar cidadãos cocriadores temos que rever redes de conversações que enrijecem as relações entre direitos e deveres, dando ao primeiro, sobreposição quanto ao segundo. Ou, permitir a propagação da rede de conversação “jeitinho brasileiro”, enaltecendo a malandragem.

Para interiorizar o sentido de comunidade em um cidadão, seguindo essa lógica, é basal criar novas redes de conversações que desconstruam redes antigas que levaram ao individualismo.

No caso do passo quatro rumo à Cidade Humana, religar o ser humano ao meio ambiente, a criação de uma nova cultura não é uma opção, mas a única possibilidade. As redes de conversações a serem desativadas a favor de novas, são muitas. Partem da noção de finito até a exacerbação do consumo e, essa, segue atrelada à economia cocriadora.

Já o sexto passo, educar em suas múltiplas formas, se apresenta como base para a criação de novas redes de conversações e apresentações de padrões recuperados de cultura. Como em um círculo que não para de se mover, em uma cadeia de ações e reações, a Cidade Humana somente se viabilizará quando for consolidada culturalmente como uma rede de conversação comum da ampla humanidade.

Adriana Silva é educomunicadora com Pós-Doutorado em Educação e pesquisadora do IPCCIC.

[1] IPCCIC, Seis Passos para a Cidade Humana. Editora Estação das Letras e Cores, São Paulo, 2019. 

[2] Maturana, Humberto; Verden-zoller, Gerda. Amar e Brincar – Fundamentos Esquecidos do Humano. Editora Palas Athena, São Paulo, 2015.

[3] Maturana, Humberto; Varela, Francisco. A Árvore do Conhecimento – as bases biológicas da compreensão humana. Editora Palas Athena, São Paulo, 2011.

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